quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

DOU publica Relatório de Identificação e Delimitação de Mbarakay e Pyelito, criando a TI Guarani Kaiowá Iguatemipeguá I

Por Tania Pacheco, do Combate ao Racismo Ambiental


Em despacho datado de 7 de janeiro de 2013, a Presidente da Funai, Marta Maria do Amaral Azevedo, acolheu e aprovou o Resumo do Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação da Terra Indígena Iguatemipegua I (Mbarakay e Pyelito), de ocupação do grupo indígena Kaiowá, localizada no município de Iguatemi, Estado do Mato Grosso do Sul.
O despacho está publicado no Diário Oficial (DOU) de  8 de janeiro (secção 1, p.25-29) , seguido do Relatório, de autoria da antropóloga Alexandra Barbosa da Silva, que é um documento ao mesmo tempo técnico e contundente, justo e indignante, científico e revoltante. Aí vai ele na íntegra, retirado apenas o início com números de processos etc e com o texto separado em parágrafos, ao contrário dos blocos ilegíveis do DOU.
O Resumo merece ser lido por tod@s @s brasileir@s dign@s. A equipe coordenada por Alexandra Barbosa da Silva deu nomes aos “donos dos bois” e a seus asseclas e mostrou claramente como os Kaiowá Guarani foram esbulhados ao longo das últimas décadas. Parabéns a ela e à equipe! Parabéns a todas as pessoas que foram execradas (e nos últimos dias perseguidas pelo Facebook) por terem acrescentado “Guarani Kaiowá” aos seus nomes! Parabéns, acima de tudo, aos Guarani Kaiowá! É a primeira de uma série de vitórias e conquistas que têm que acontecer o mais rápido possível! Que vengan!


Resumo do Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação da Terra Indígena Iguatemipegua I

I – Primeira Parte – Dados gerais
Os povos indígenas Guarani Kaiowa e Guarani Ñandéva, falantes da língua guarani, integrantes da família linguística Tupiguarani e do tronco Tupi, em Mato Grosso do Sul ocupam o Cone Sul do estado, somando 46.675 pessoas (fonte: Funasa, 2011), que se distribuem em 33 localidades (entre terras indígenas e acampamentos). A partir de dados arqueológicos e de fontes escritas sabe-se que os povos falantes do guarani habitam as florestas tropicais e subtropicais da parte meridional do Brasil (regiões Sul, Sudeste, além do atual Mato Grosso do Sul) desde 1.200 anos a.C., aproximadamente.
Desde a conquista europeia, diferentes indivíduos e agências não indígenas (como missionários e frentes de ocupação) vieram a impingir-lhes uma coexistência e uma viva interação, que tiveram efeitos cruciais sobre a dinâmica territorial destes povos. Na região do cone sul, especificamente, os relatos orais indígenas, bem como diversos registros e documentação escrita comprovam o uso e a ocupação tradicional kaiowa dos espaços territoriais que compõem o tekoha guasu constituído pelas terras da margem esquerda do rio Iguatemi. Trata-se, pois, de um amplo território, no interior do qual esses indígenas ocupam as margens e cabeceiras de cursos d’água (minas, rios e córregos) que convergem para o rio Iguatemi. Desse modo, o termo (guarani) “Iguatemipegua” refere-se àqueles que são relacionados a ou procedentes da região do (rio) Iguatemi.
Do ponto de vista histórico, está patente que a partir das últimas décadas do século XIX, migrantes paulistas, mineiros, gaúchos e paranaenses começaram a se fixar em meio aos ervais nativos do cone sul de MS, dando início a atividades agropecuárias na região, disputando terras com a Cia. Matte Larangeira e estabelecendo sérios obstáculos à ocupação indígena. De acordo com a documentação existente nos arquivos da Funai, nas décadas de 1910 e 1920 o Serviço de Proteção aos Índios (SPI) definiu 8 lotes, com superfície de 3.600 ha (légua em quadra) cada, para serem reservados aos Kaiowa e aos Ñandeva, sempre no Cone Sul do estado. Sob a perspectiva assimilacionista, nesses lotes, situados próximo a centros urbanos, vieram a ser instalados postos administrativos, com a atração de indígenas de diferentes tekoha, com vistas a integrá-los ao modo de vida classificado como “civilizado”, liberando assim vastas extensões territoriais para a colonização. Esse projeto de colonização, assim, impôs aos indígenas um processo paulatino de expropriação (esbulho) territorial ao qual nunca houve conformação.
A demarcação dessas áreas deu-se efetivamente com extensões inferiores aos 3.600 ha e correspondem às T.I.s Benjamim Constant (2.429 ha) e Limão Verde (660 ha), em Amambai; Caarapó (3.594 ha), em Caarapó; Dourados (3.475 ha), em Dourados; Takuapery (1.886 ha), em Coronel Sapucaia; Porto Lindo (1.649 ha), em Japorã; Pirajuy (2.118 ha), em Paranhos, e Sassoró (1.923 ha), em Tacuru. Além disso, essas reservas abrangeram somente fragmentos de tendápe e/ou tekoha, sem levar em conta a especificidade da dinâmica territorial dos Kaiowa e dos Ñandeva. Com base em ampla pesquisa de natureza multidisciplinar, constata-se que esse processo histórico de esbulho renitente comprovado explica a atual situação de extrema vulnerabilidade social e territorial vivida pelos Kaiowa da TI Iguatemipegua I.

II – Segunda Parte – Habitação Permanente
O modo de ocupação do território pelos kaiowa configura-se historicamente sob a forma de grandes redes de aliança geograficamente referidas, com contornos sociológicos dinâmicos e fluidos, geralmente dispostas no interior de uma bacia hidrográfica definida. Uma ou mais te’yi ou ñemoñare (famílias extensas ou grupos macrofamiliares) articuladas assentam-se em um tendápe (microrregião ou cantão); vários tendápe articulados, por sua vez, configuram um
tekoha (“aldeia” ou “comunidade”, grosso modo); a articulação de vários tekoha resulta em um tekoha guasu/pavê (grande território).
Cada te’yi ou ñemoñare organiza-se em torno de um ancião e/ou anciã (tamõi ou jari). Tendo em vista que os Kaiowa organizam suas relações de parentesco em termos de bilateralidade, uma pessoa pode considerar-se pertencente tanto ao local de origem de seu pai como ao local de origem de sua mãe. O status do casal de líderes é proporcional ao número de famílias nucleares que compõem a parentela; neste sentido, a morte ou a substituição do casal articulador gera
rearranjos territoriais e políticos, podendo ocorrer a formação de um novo tekoha.
A partir de meados dos anos 1940, no interior do tekoha guasu Iguatemipegua foram transferidas compulsoriamente para as Reservas de Sassoró, Limão Verde, Amambai e Takuapiry muitas famílias kaiowa originárias das diversas microrregiões dos tekoha Pyelito e Mbarakay (como Mba’ e guay, Y hû miri, Tata rendy, Arroio Pe, Souza Kue, Yvu Pochy Guasu, Takuajusyry, Mbarakay’i, Tapesuaty, Aguara kua, Naranjaty guasu, Maci Kue, Remísio Kue, Itamoro, Jetyaisyry, Petyry, Yryvuy, Galego kue, Ysau, Pyelito, Mandiy e Siriguelo). Tais famílias estabeleceram laços de parentesco entre si, conformando redes de relações articuladas de modo indissolúvel com esses espaços territoriais. Além de documentação escrita, histórias de vida de algumas lideranças contemporâneas ilustram o processo mais amplo de esbulho territorial praticado contra essas famílias kaiowa.
Em relação ao tekoha Mbarakay, sabe-se que, em meados dos anos de 1950, na microrregião denominada Mba’e guay, instalou-se o não índio de nome Vidal Amaral. Mba’e guay localiza-se de modo central no tekoha Mbarakay e era onde à época vivia a família encabeçada pelo tamõi (chefe de família extensa) Major Gonçalves. Não tardou para Vidal soltar seus bois pelo Mba’e guay, numa estratégia bastante comum na época. De acordo com a memória oral dos indígenas, antes de Vidal ali chegar, os Kaiowa residentes, além das roças, possuíam também algum gado vacum e porcos, além de alguns cavalos, aos quais Vidal Amaral ajuntou seus próprios animais, de modo a misturá-los e confundí-los com aqueles dos indígenas. Perante o descontentamento dos kaiowa, o fazendeiro afirmava que se estes estivessem descontentes, poderiam se mudar.
Foi então que o tamõi Major Gonçalves deslocou-se com sua família para a microrregião Souza Kue, onde já se encontrava outra família kaiowa, chefiada por Leandro Martins. Este último (já ancião) lembrou-se de que anteriormente (quando ainda era rapaz, isto é, mitã rusu), homens da família não indígena Aquino assenhorearam-se de diversas microrregiões de Mbarakay; assim, Alitre e Selvino Aquino apossaram-se da microrregião “Maci Kue”, momento em que a família de Leandro teve que sair de lá, indo justamente para a microrregião Souza Kue. Devido a esses deslocamentos todos, na microrregião Mba’e guay ficaram, de fato, aqueles que aceitaram prestar serviços para Vidal.
Já por conta da coação de outro não índio, Dingo Silveira, que se instalou também no que é reconhecido como a região de Mba’e guay, o indígena filho de Major Gonçalves (Aristides Gonçalves) e sua mãe acabaram indo para a T.I. Sassoró. Contudo, devido à necessidade de mão de obra, posteriormente Dingo incorporou Aristides e seu irmão, já no trabalho “na diária” (isto é, trabalho remunerado por dia). Já para fins da década de 1960 chegou à microrregião denominada Yvu Pochy Guasu (literalmente, “mina [d'água] grande e brava”) o não índio conhecido como Otacílio, e antes dele, o “gato” (empreiteiro) José Escobar, para quem alguns kaiowa trabalharam na derrubada de mato.
Com Escobar já explorando a mão de obra indígena, Otacílio e Escobar se aliaram para a retirada e comércio de madeira. Dentre os que trabalharam para Escobar estava Rondon Rodrigues (filho do tamõi Bringo Rodrigues e pai de Adélio Rodrigues). Em outro momento, tanto Rondon quanto seu irmão, Orcídio Lopes Rodrigues, foram trabalhar com outro fazendeiro, o Breda, que se instalara e derrubara o mato na microrregião de Tapesuaty – isto quando Orcídio tinha pouco mais de 20 anos, ou seja, no fim dos anos de 1950.
Orcídio conta que saiu do lugar, mas Rondon ficou, com a mãe, só que não mais podendo fazer roça nem criar animais para si. Orcídio foi com a esposa para a reserva de Sassoró, onde seu sogro estava residindo. A família de Adélio Rodrigues se viu obrigada a se retirar do tekoha em meados de 1970, sendo que outras famílias kaiowa lá permaneceram. No ano de 1974, após serem expulsos pelo fazendeiro Otacílio, missionários da Missão Evangélica Kaiowa iam a Mbarakay para buscar os indígenas de caminhonete e levá-los para a reserva de Sassoró. Por seu turno, Pyelito é o nome dado a um tekoha pelas famílias kaiowa daí originárias. Nas fontes escritas é possível encontrar grafias como “Povinho”, “Pueblito” e “Poblinho” para referi-lo.
Esse termo, provavelmente, acabou firmando-se a partir da fala de não índios de origem paraguaia, que se estabeleceram na região. Conforme se depreende de seu significado em castelhano (i.e., “pueblito” = pequeno povoado), o termo refere-se à existência de um pequeno agrupamento humano. Entre os índios, a pronúncia em guarani se torna “pyelito”, muitas vezes sendo-lhe adicionada a partícula ”kue” (indicativa de tempo passado, significando “o que foi” ou “o que era”); assim, “Pyelito Kue” designa “o [lugar] que era o Pyelito”.
Os kaiowa entrevistados remeteram sua saída compulsória de Pyelito aos anos de 1940 e a 1950, sendo que o deslocamento mais significativo deu-se já durante os anos de 1970. A lembrança desses indígenas é que três irmãos de sobrenome Nogueira (isto é, Oscar, Filomeno e João) foram os primeiros não índios a se apresentarem como proprietários nos espaços do tekoha Pyelito. Outro parente dos Nogueira era Fortunato Fernandes, que se tornou proprietário de uma fazenda, incluída no território do tekoha Pyelito. Filomeno Nogueira é aquele mesmo que encontra-se referido em documentos do SPI como “Philomeno Nogueira” (como no “telegrama de n° 1738″, do dia 3 de agosto de 1942, destinado ao chefe do Posto Indígena Benjamim Constant), onde pedia que o funcionário tomasse “providências
no sentido de mandar retirar de minha propriedade ‘Santa Rita’ uma turma de índios que ali se acham. Pois estão me prejudicando na minha referida propriedade”. Segundo os entrevistados, Philomeno foi promovendo uma fragmentação da propriedade sobre a terra, provocando com isto o aparecimento de vários outros ocupantes não indígenas – entre estes, um cidadão paraguaio, de nome Moisés.
Os irmãos Alcebíades Vargas e Elcílio Vargas (ou “Delcílio”), junto com seus genros Aníbal Ramos e Ubaldo Porto, também foram referidos como tendo se apropriado de outras microrregiões que compunham o território de Pyelito. Especificamente na microrregião denominada Pyelito, foi por pressão direta do paraguaio Moisés que os kaiowa que aí viviam tiveram que deixar o local. Entretanto, Elcílio Vargas, que havia se instalado na microrregião de Ysau (vizinha da
microrregião Pyelito), ao invés de expulsar as famílias que lá viviam, passou a atrair aqueles que haviam sido expulsos de Pyelito. Os Kaiowa foram unânimes em afirmar que Elcílio Vargas difundia em toda a região que todos os de Pyelito que quisessem, poderiam se mudar para o Ysau, pois aí seriam acolhidos e teriam trabalho.
Como se pode perceber a partir dos documentos pesquisados, esse convite respondia à necessidade de mais mão de obra para o trabalho. Neste sentido, observa-se que a intensidade da pressão e dos conflitos sobre Pyelito variou durante os anos, conforme os títulos de propriedade foram sendo subdivididos. Ao passar das mãos de apenas uma pessoa às de várias outras, a subdivisão causou uma forte pressão e atingiu a dinâmica territorial interna das famílias de Pyelito, que viram-se obrigadas a ir se transferindo de uma microrregião para outra, se instalando nas já fazendas, obrigados a trabalhar para o novo patrão, ou mesmo a se afastarem do tekoha Pyelito, indo para as reservas criadas pelo SPI (mormente a de Sassoró).
Em que pese o processo de expropriação (esbulho renitente comprovado), verifica-se que essas famílias kaiowa continuam acessando pontos dos tekoha de origem para realizar suas atividades tradicionais. Assim, ainda que não tenham logrado manter a posse plena sobre a totalidade das áreas tradicionalmente ocupadas, os indígenas continuaram usando e ocupando essas áreas das maneiras que lhes foram facultadas: coletando, caçando, pescando, ainda que com grandes cerceamentos, assim como embrenhando-se nas matas ainda preservadas (de início) e depois na condição de “peões” das fazendas que se estabeleceram nos tekoha, ou ainda em trabalhos sazonais. Por isso, no presente observam-se iniciativas coletivas de recuperação dos espaços territoriais expropriados, sob a forma de acampamentos, restando comprovado que a colonização não foi capaz de destruir o vínculo indissolúvel que essas famílias mantêm com a TI Iguatemipegua I, o qual continua a estruturar sua visão de mundo e organização sociopolítica.

III – Terceira Parte – Atividades produtivas
O grupo doméstico (composto por uma família extensa de pelo menos três gerações) é o eixo em torno do qual giram todas as atividades entre os Kaiowa. Deste modo, é também para esta unidade sociológica que precisamos olhar para compreender como as atividades técnicas e econômicas destes indígenas são organizadas. É possível identificarmos dois principais níveis territoriais tanto de produção de recursos materiais e de alimentos quanto de acesso a estes.
O primeiro diz respeito ao espaço doméstico de um grupo de três gerações (isto é, um te’yi) e suas imediações, onde se desenvolvem as atividades culinárias, de produção de objetos e instrumentos, produção agrícola e de plantas medicinais e criação de animais, bem como a captação de água e o desenvolvimento de atividades de coleta de lenha, frutas, mel, e caça com armadilhas, nos casos em que o grupo doméstico esteja estabelecido junto a áreas florestais. Desse modo, os recursos necessários às atividades produtivas desenvolvidas pelos kaiowa da TI Iguatemipegua I encontram-se na área compreendida pelos córregos Mandiy, Ypane e Siriguelo, pelo rio Mbarakay e por todas as demais nascentes e cursos d’água conexos que compõem a microbacia do rio Hovy ["Jogui"] (por sua vez, constituinte da bacia do rio Iguatemi). O raio de ação deste primeiro nível territorial é de poucas centenas de metros a partir dos espaços das residências.
O segundo nível refere-se aos espaços amplamente diversificados (seja em tamanho, seja em características ecológicas)
onde são desenvolvidas as atividades definidas pelos Kaiowa como jeheka (“ir à procura de”), que incluem a coleta de matéria prima, frutos silvestres, certas práticas de caça e de pesca, mas também, nos dias de hoje, as transações comerciais e trocas (escambo), os trabalhos temporários em fazendas (as chamadas changas) e o engajamento
na colheita da cana para a indústria sucroalcooleira.
Neste segundo nível, o raio de ação poderá variar desde alguns quilômetros (no caso de existirem rios, córregos e matas nas imediações, bem como parentes assentados nas proximidades, com os quais se compor equipes para execução das atividades ou se estabelecerem circuitos de troca, internamente aos espaços de abrangência e de jurisdição de uma comunidade política local), até várias dezenas de quilômetros – quando o jeheka se orienta para mais longe das residências, em locais de pesca e de caça mais especializados, mas também, nos dias atuais, para as cidades, fazendas e usinas de álcool.
Com exceção para este último caso, em que a produção da cana pode ser localizada a centenas de quilômetros das residências indígenas, as outras atividades se dão quase que exclusivamente no interior do tekoha guasu (território amplo) a que as pessoas pertencem, sendo também acionada, para tal propósito, a ampla rede de parentes existente neste vasto espaço, a qual permite a criação de bases para o desenvolvimento de práticas mais especializadas de jeheka.
A literatura especializada e documentos ressaltam o fato de os Guarani serem povos agricultores. Até hoje a agricultura é a atividade de produção de alimentos mais valorizada pelos kaiowa, de modo que sua importância não se reduz a aspectos econômicos, mas abrange uma dimensão simbólica e ritual extremamente significativa. Tal importância da agricultura é percebida mesmo nas reservas superpovoadas, onde, embora bastante cerceada, ela segue sendo praticada, conforme se pôde constatar em todas as áreas visitadas pelos integrantes deste Grupo Técnico, ou seja, Amambai, Limão Verde, Sassoró e Takuapery (todas sendo áreas reservadas ainda pelo SPI), além da T.I. Jaguapiré (identificada e demarcada entre a segunda metade da década de 1980 e os inícios da de 1990). Nos lugares em que fazem suas roças, os kaiowa não formam monoculturas, consorciando vários tipos de plantas alimentares, como milho, mandioca, arroz, feijão, batata doce, cará, abóbora, cana-de-açúcar, banana, dentre outras, (plantando também urucum, usado como tintura, e eventualmente tabaco, principalmente para mascar).
Embora todas estas plantas façam parte da dieta dos índios, sem dúvida as mais importantes são a mandioca e o milho. A mandioca é cultivada durante todo o ano, constituindo-se em alimento que fornece carboidratos cotidianamente. As diversas variedades de milho ocupam um lugar particular. O avati morotî (milho branco), de modo especial, é importante nas relações cosmológicas, estando na base da cerimônia anual do avatikyry (o batismo do milho e das plantas novas), que ocorre entre fevereiro e março. Em relação à sua produção, ela é geralmente limitada, sendo que, no caso do milho branco, em decorrência também de sua raridade e escassez, o seu cultivo parece ter adquirido maior importância simbólica em relação ao passado, sendo hoje associado quase que exclusivamente a necessidades rituais – e, consequentemente, relacionado a atividades xamanísticas.
As atividades de caça e de pesca entre os Guarani não têm apenas uma função técnica e econômica; elas são tidas também como uma forma de esporte. Deste modo, elas são relevantes para os processos de socialização das crianças e para a competição (sempre jocosa) entre os indivíduos. Elas também compõem o rol de jeheka. A circulação pelo território implica no conhecimento deste, visando constituir um mapeamento dos recursos aí existentes. Desta forma, o
“andar” (oguata) pelo território quase sempre traz consigo uma combinação de atividades, podendo-se caçar, pescar, coletar frutos, mel e lenha. Ademais, nos dias de hoje, o jeheka se compõe ainda de trabalhos temporários (changa) nas fazendas ou nas usinas sucroalcooleiras, bem como de coleta de objetos (como latas e galões de plástico, que serão reutilizados para fins domésticos) nos centros urbanos, de transações de objetos etc.
Dadas as condições extremamente precárias, decorrentes da superpopulação nas terras de posse dos kaiowa em Mato Grosso do Sul, o trabalho sazonal nas usinas se tornou o meio francamente generalizado para obtenção dos recursos alimentícios e de consumo em geral das famílias, sendo complementado também por cestas básicas provenientes de programas governamentais. Cabe enfatizar que, se, por um lado, esses meios se generalizaram, favorecendo de algum modo a sobrevivência dos indígenas, sobretudo o trabalho nas usinas tem efeitos deletérios sobre a saúde, o bem estar e a longevidade de toda uma coletividade adulta masculina, além de se proceder, na grande maioria dos casos, em situações que colocam os Kaiowa (e Ñandéva) em geral em extrema vulnerabilidade social, com desrespeito a direitos humanos básicos.

IV – Quarta Parte – Meio ambiente
Uma constatação evidente hoje nas áreas em posse dos indígenas é a degradação ambiental em termos amplos. Contudo, não obstante essa degradação, os Kaiowa buscam formas de continuar coletando víveres, percorrendo o território, plantando e caçando, na medida do possível. Já uma terceira constatação salientada pelo estudo ambiental realizado é a de que os indígenas fazem de tudo para dar continuidade à relação que mantinham com os ambientes florestais nativos existentes em tempos passados.
A atividade agropecuária, com base na criação extensiva e na monocultura para comércio e exportação, provocou o quase total desmatamento do cone sul do estado de Mato Grosso do Sul. Assim, para os Kaiowa é evidente que decaíram os recursos provenientes das florestas e do cerrado nativos, sendo esta queda um fator influente no desenvolvimento das atividades dos indígenas no novo cenário ambiental.
A relação que os Kaiowa estabelecem com o meio ambiente e o território se desdobra em aspectos simbólicos e políticos bastante complexos, recorrentes no histórico de ocupação na região. A coleta nos remanescentes de mata e em todas as unidades de paisagem faz parte das atividades tradicionais cotidianas dos Kaiowa, quando os não índios permitem que eles frequentem estes lugares. Os índios procuram e coletam uma diversidade grande de produtos na vegetação nativa: madeira para construção, plantas medicinais e rituais, sapé e outras fibras para cobertura das casas, frutas, tubérculos, sementes, materiais para artesanato e mel. Para os Kaiowa, o mel é um dos produtos de coleta mais importantes. Os índios reconhecem grande quantidade de espécies de abelhas nativas e detêm um grande conhecimento sobre os lugares de nidificação e as formas e estruturas das colméias que variam em função de cada espécie. A vegetação da mata é certamente o ambiente que, pela sua riqueza natural, oferece mais produtos de coleta e de caça. Mas em todas as unidades da paisagem (mata, cerradão, campo, brejo, rios e córregos, minas de água) os índios encontram plantas que aproveitam para usos variados.
Dentre todos os produtos de coleta, as plantas medicinais têm um papel bastante privilegiado. A partir dos estudos ambientais realizados foi possível perceber a riqueza e a sofisticação do conhecimento sobre os elementos de um território onde os Kaiowa têm vivido por séculos, procedendo eles a uma investigação e a experimentações, obtendo, portanto, resultados mais condizentes com as necessidades para a reprodução física e cultural desses grupos. O conhecimento ecológico e o uso tradicional dos recursos naturais se mantêm, com vigor, nos dias de hoje, mesmo com condições ambientais bastante deterioradas.
O modo de ocupação territorial dos kaiowa consiste em um meio excelente de manejo, que contribui para a manutenção e a reprodução de condições otimizadas na relação das pessoas com o ambiente, e que, sobretudo, será um fator fundamental para a recuperação e manutenção dos recursos e para a reprodução física e cultural no interior da Terra Indígena Iguatemipegua I. Os recursos necessários ao bem estar dos kaiowa desta TI encontram-se na área compreendida pelos córregos Mandiy, Ypane e Siriguelo, pelo rio Mbarakay e por todas as demais nascentes e cursos d’água conexos que compõem a microbacia do rio Hovy ["Jogui"] (por sua vez, constituinte da bacia do rio Iguatemi), contemplados na presente proposta de limites.

V – Quinta Parte – Reprodução física e cultural
A terra é concebida como o lugar que foi entregue pelas divindades aos Kaiowa, para que nela vivessem e dela cuidassem; nesses termos, o valor dado à terra não é unicamente econômico, mas também, e de modo fundamental, um valor simbólico. A relação que cada comunidade estabelece com espaços territoriais específicos (tendápe ou microrregiões) é única e inextricável.
No que tange às práticas relativas à morte e portanto ao desaparecimento de um indivíduo tanto do seu mundo físico quanto social, entre os grupos de fala guarani em geral, a morte implica cuidados excepcionais para com a ”alma” do falecido. Grosso modo, enquanto ser completo, a pessoa é composta pelo menos de duas diferentes almas. A alma que corresponde à identidade pura e divina da pessoa (denominada ñe’e [= fala] expressa-se como ayvu [= pássaro]), a qual, após a morte do corpo, retornará ao patamar celeste de onde é originária. A segunda alma (o anguê ou anguêry) é aquela que se carrega das vicissitudes e impurezas da vida na terra; é a que constitui a sombra da pessoa e, com o falecimento do corpo, torna-se um potencial perigo aos vivos. Deve haver todo um cuidado ritual para que esta segunda alma não provoque males aos vivos; caso contrário, ela pode impingir-lhes doenças e mesmo a morte, sendo tida como geradora também dos suicídios. Por tal motivo, outrora, com espaço à disposição, se queimava a casa do falecido e seu grupo familiar se transferia para outro lugar.
Um conjunto de fatores – como a intervenção dos modos não indígenas de proceder aos sepultamentos e a cada vez maior dificuldade de queimar a casa e transferir-se, dentro das aldeias superpovoadas – levou à definição de um espaço único para sepultamento de todos os que habitam uma determinada terra indígena: o cemitério. Devido a concentração física dos corpos dos mortos – algo novo para estes indígenas – com os procedimentos e a relação com o morto permanecem nos limites estritos do seu grupo político e de parentesco. É importante destacar o imperativo da ligação inextricável com a terra à qual esta pessoa pertenceu em vida, tornando-se a lembrança do falecido e os seus despojos mortais parte do patrimônio simbólico daqueles vivos que constituem a sua comunidade de pertencimento.
Sepultar a pessoa numa terra com a qual não guarda uma relação de identidade, ou seja, à qual ela não pertence, constitui uma anomalia de difícil equação em termos cosmológicos e espirituais para os Kaiowa, constituindo-se em algo que deve ter, em algum momento, conserto para que o ordenamento sociocosmológico se torne aquele que deve ser, o correto. Por constituírem um indício significativo e materialmente visível da ligação dos indígenas com seu território, uma prática generalizada foi a de os proprietários não indígenas destruírem as sepulturas (yta) que se encontravam nos limites das fazendas, fato que provocou grande insatisfação e preocupação entre os indígenas também de modo generalizado.
A realização deste sentimento de autoctonia se dá através do recorte de espaços específicos dessa terra, que se tornam suporte para o desenvolvimento da vida de cada comunidade política kaiowa. Assim, é justamente uma jurisdição exclusiva por parte de cada comunidade sobre cada um desses espaços que permite identificar as fronteiras
intercomunitárias. Com efeito, não estamos diante da imagem de um território unívoco, como uma totalidade homogênea, mas de espaços territoriais diferenciados, de acordo com as comunidades que os povoam – ou seja, cada comunidade relacionada a seu tendápe (lugar ou microrregião específica). Neste sentido, o valor que é dado à terra
tem sido imensamente potencializado pelas comunidades kaiowa, justamente pelo fato de ela ter sido parcialmente retirada de seus domínios – o que lhes impede de realizar, como deveria, o seu próprio modo de ser e de viver (o teko porã).
As metáforas utilizadas pelos Guarani para indicar as características da terra são geralmente ligadas ao corpo humano, onde as funções primárias de comer, descansar e alimentar passam a ser atributos importantes para sua fisiologia. De acordo com pesquisas etnológicas recentes, os Kaiowa permitem que a terra se alimente durante o descanso previsto nas técnicas de coivara, mediante o qual haverá um reflorestamento espontâneo (denominado pelos índios de ñemboka’aguyjevy, ou seja, “deixar o mato voltar a crescer”), enquanto no lugar plantado será a própria terra que alimentará os índios. Os rituais (como o avatikyry), por sua vez, permitirão que esta terra não adoeça, mantendo o equilíbrio nessa relação simbiótica.
Assim, as áreas necessárias à reprodução física e cultural dos kaiowa da TI Iguatemipegua I, segundo seus usos, costumes e tradições, encontram-se na área compreendida pelos córregos Mandiy, Ypane e Siriguelo, pelo rio Mbarakay e por todas as demais nascentes e cursos d’água conexos que compõem a microbacia do rio Hovy ["Jogui"] (por sua vez, constituinte da bacia do rio Iguatemi).

VI Parte – Levantamento fundiário
A colonização do cone sul do estado de Mato Grosso do Sul revelou um processo de ocupação das terras por não indígenas iniciando-se em meados da década de 1830 – com migrações do norte de Mato Grosso, bem como posteriormente, de Minas Gerais e São Paulo (Corrêa, 1999) -, mas consolidando-se já nas primeiras décadas do século XX, na esteira do fim do monopólio obtido pela Companhia Matte Larangeira. A exploração da erva mate e o estabelecimento de fazendas foram responsáveis pelo desenvolvimento de infra-estruturas urbanísticas (lojas, mercearias e mercados, bancos, escolas, postos de saúde), o que acabou por dar lugar à constituição de arraiais e centros urbanos, de dimensões e portes variados.
O núcleo urbano de relativo porte mais antigo da região é Ponta Porã, cidade fronteiriça com Pedro Juan Caballero (Paraguai), cujo município atualmente conta com 77.872 habitantes (IBGE, 2010). Dourados, a segunda cidade mais importante do estado (depois da capital, Campo Grande), cujo município tem 196.035 habitantes (IBGE, 2010), até os anos de 1930 era apenas um distrito do município de Ponta Porã, constituindo um povoado. Na década de 1940 ocorreu a emancipação do município de Dourados, que nos anos 50 viu serem abertas estradas que permitiram a ligação com diversos pontos, ocorrendo um grande incremento da produção agrícola e um concomitante crescimento populacional, devido à migração, especialmente de gaúchos.
O estado de Mato Grosso do Sul como um todo, e seu cone sul em particular, sofreu um desmatamento progressivo em sua superfície, havendo, além de alguns investimentos em café, a formação de grandes extensões de pasto de modo generalizado, no correr dos anos 1960, mas com grande parte das matas ainda se mantendo conservadas até os primeiros anos da década de 1970. Durante esta década foi que se procedeu a um desflorestamento, este sim quase
total, da região, num período em que se efetivava a implantação, de modo maciço, da cultura extensiva da cana e mormente da soja, ao mesmo tempo em que se acentuava a mecanização das atividades agrícolas. Por seu turno, a extração madeireira também passou a se apresentar como atividade altamente rentável nesta década.
Na Terra Indígena Jaguapiré (município de Tacuru) há muitos índios que ainda nos anos 80 trabalharam para a derrubada de mato na região. As grandes e muitas empreitadas para derrubada do mato foram levadas adiante através da figura do empreiteiro (o “gato”), aquele que gerenciava o trabalho e subcontratava os índios. A maior parte desses empreiteiros foi de cidadãos paraguaios – repetindo o que ocorrera na exploração da erva no séc. XIX. Assim sendo, num primeiro momento, muito embora a terra tivesse sido recortada e titulada em imóveis particulares (as fazendas), muitas porções dela permaneciam inexploradas pelos não índios. Nos relatos de regionais é corrente a afirmação de que, quando imperavam as matas, se ouvia o rugir de onças, indicando que estes espaços não eram frequentados por não índios. Assim, se houve inúmeros casos de expulsão de famílias indígenas, houve também fazendeiros que empregaram mão de obra kaiowa no trabalho das fazendas.
Há documentos do SPI de que, nos anos 1940, havia “um grupo de 215 índios” vivendo no tekoha Pyelito, cuja posse passou a ser requerida por um “particular” (Antônio Lopes da Silva), o qual, por sua vez, havia encaminhado um pedido de titulação sobre 500 hectares de terra, obtendo, ao fim e de fato, sem que se tenha conhecimento de por quais motivos, uma parcela bastante maior: de 2.000 hectares. Uma vez alcançada a titulação, Antônio vendeu as terras a Philomeno Nogueira, que passou a pressionar pela retirada da comunidade indígena do local, vindo então os agentes do SPI a tomar providências, buscando os instrumentos legais para tal. Segundo relatos colhidos no âmbito dos trabalhos deste GT, Philomeno Nogueira foi promovendo uma fragmentação da propriedade sobre a terra, provocando com isto a fixação de vários outros não indígenas – entre estes, um cidadão paraguaio, de nome Moisés, que expulsou várias famílias do tekoha.
Os irmãos Alcebíades Vargas e Elcílio Vargas (ou “Delcílio”), junto com seus genros Aníbal Ramos e Ubaldo Porto, também se apropriaram de outras microrregiões que compunham o território de Pyelito. No que concerne especificamente à microrregião denominada Pyelito, foi por pressão direta do paraguaio Moisés que os kaiowa que aí viviam tiveram que deixar o local. Há documentação do então SPI (extinto em 1967) que relata a disputa fundiária dos indígenas não só com Philomeno Nogueira, mas com diversos outros não indígenas.
Como se constata, as famílias kaiowa entrevistadas pertencentes ao tekoha Pyelito, bem como aquelas pertencentes ao tekoha Mbarakay ocupavam os espaços constituintes da TI Iguatemipegua I sem serem importunadas em suas vidas e atividades por não indígenas; no primeiro caso, até inícios da década de 1940 e no segundo, até os inícios dos anos 1950. Seus relatos revelam, de modo coletivo, que foi a partir daqueles respectivos momentos que se viram premidas por não índios, que, ao se apossarem dos espaços territoriais aqui em questão, passaram a assumir estratégias distintas, seja incorporando-as como mão de obra, seja expulsando-as das terras. Ocorria ainda de mesmo as famílias incorporadas como mão de obra se desentendessem com o patrão e fossem então expulsas das fazendas. O retorno para a terra, porém, se deu em um significativo número de casos, já no trabalho para outros patrões, muitas vezes herdeiros dos primeiros. Tal estado de coisas revela uma persistência das famílias em permanecerem na posse dessas terras.
O esbulho sofrido, em grande número de casos, teve a participação de agentes do órgão indigenista oficial e, no caso da comunidade de Mbarakay, também de missionários. As terras que compõem a T.I Iguatemipegua I, ora delimitada, se encontram no que veio a se constituir como o município de Iguatemi, caracterizado por uma economia com base na agropecuária, enquadrando-se no chamado ”agronegócio”, em que a pecuária extensiva e a produção monocultora (voltada para o comércio e a exportação) é determinante para o modo de exploração da terra.
O povoamento de Iguatemi teve início a partir do Forte Iguatemi (construído entre 1765 e 1770), destruído em ataques das forças do Paraguai, em 1777. Em 1948 foi elevado a distrito e o município foi criado em 1963. No ano de 2007 ele apresentou uma produção de 33.600 ton. de soja em grão, 29.200 ton. de milho em grão e 375 ton. de feijão em grão (IBGE). A produção de gado bovino é uma grande marca sua: em 2011 o município apresentava um rebanho de 282.985 cabeças (fonte: IBGE). Em contraste, sua população humana em 2010 era de 14.875 hab., distribuídos em 2.946.524 km2 (IBGE); a relação pop./território é, assim, de 5,05 habitantes/km2.
Verificou-se que o panorama fundiário atual é resultado do processo histórico de esbulho renitente praticado contra os Kaiowa em geral e as famílias específicas das comunidades de Mbaraky e Pyelito. De acordo com os estudos de natureza cartorial e fundiária, foram detectados 46 imóveis no interior da TI Iguatemipegua I, sendo que destes foi obtida a área aproximada de 31 imóveis (por declaração de titulares ou de proprietários), que em conjunto somariam em torno de 32.253 ha, ou uma média de 1.040 ha por imóvel. Considerando apenas a porção do imóvel inserida na TI ora delimitada, a menor extensão é de 48 ha e a maior, de 5.339,4950 ha. As benfeitorias mais comuns são pastos e cercas, passando por currais e outras benfeitorias produtivas voltadas à pecuária de corte.
Nas sedes existem casas para funcionários, galpões para insumos e máquinas e casas sedes. Na área como um todo existem cerca de 85km de estradas cascalhadas, públicas. Em alguns imóveis há estradas particulares ou estradas de acesso compartilhadas com outros imóveis. Registre-se que a avaliação detalhada das ocupações e benfeitorias será realizada após a expedição da Portaria Declaratória da Terra Indígena Iguatemipegua I, com vistas ao pagamento de indenizações, na forma da lei.
Foi realizada consulta ao Cartório de Registro de Imóveis de Iguatemi, as informações solicitadas, no entanto, não foram enviadas a Funai até o presente momento. O respectivo ”Demonstrativo de ocupantes não-índios” é apresentado a seguir.


VII – Parte – Conclusão e delimitação
Tendo por base estudos de natureza etnohistórica, antropológica, documental escrita, ambiental, cartográfica e fundiária, reunidos por equipe técnica qualificada, autorizados por Portarias da Presidência da FUNAI, em conformidade com o disposto no Decreto 1775/96, conclui-se que a terra indígena ora delimitada consiste numa superfície aproximada de 41.571 hectares e perímetro aproximado de 100 Km (como representado em mapa e memorial descritivo, que seguem abaixo), situando-se no município de Iguatemi. A TI Iguatemipegua I é de ocupação tradicional das famílias kaiowa dos tekoha Pyelito e Mbarakay, apresentando as condições ambientais necessárias à realização das atividades dessas mesmas famílias e tendo importância crucial do ponto de vista de seu bem estar e de suas necessidades de reprodução física e cultural, segundo seus usos costumes e tradições, correspondendo, portanto, ao disposto no artigo 231 da Constituição Federal vigente.

Alexandra Barbosa da Silva
Antropóloga coordenadora do GT

MEMORIAL DESCRITIVO

Inicia-se a descrição deste perímetro no ponto P-01, de coordenadas geográficas aproximadas 23°17’24,3 S e 54°46’14,6 WGr., situado na confluência de um córrego sem denominação com o Rio Maracaí,; deste, segue pela margem direita do referido rio, a jusante, até o Ponto P-02, de coordenadas geográficas aproximadas 23°21’32,5 S e 54°36’34,3 WGr.; localizado na confluência de um córrego sem denominação, daí, segue pelo referido córrego, a montante, até o ponto P-03, de coordenadas geográficas aproximadas 23°25’15,5 S e 54°37’46,8 WGr., localizado na sua cabeceira em uma região de erosão; daí, segue por linha reta até o ponto P-04, de coordenadas geográficas aproximadas 23°26’03,5 S e 4°38’04,5 WGr., situado na cabeceira do Córrego Siriguelo em uma região de erosão; daí, segue pelo citado córrego, a jusante, até o ponto P-05, de coordenadas geográficas aproximadas 23°35’31,5 S e 54°41’51,8 WGr., localizado em uma ponte da rodovia MS-386; daí, segue pelo referido córrego, a jusante, até a confluência com o Rio Joguí no ponto P-06, de coordenadas geográficas aproximadas 23°36’42,5 S e 54°42’42,3 WGr.; daí, segue pela margem esquerda do referido rio, a montante até a confluência do Córrego Ipané no ponto P-07, de coordenadas geográficas aproximadas 23°35’01,4 S e 54°44’44,2 WGr.; daí, segue pela margem esquerda do referido córrego, a montante, até o ponto P-08, de coordenadas geográficas aproximadas 23°34’01,2 S e 54°44’28,8 WGr., localizado em uma ponte da rodovia MS-386; daí, segue pelo referido córrego pela margem esquerda, a montante, até o ponto P-09, de coordenadas geográficas aproximadas 23°24’44,3 S e 54°45’22,1 WGr., localizado na margem do referido córrego; daí, segue por linha reta até o ponto P-10, de coordenadas geográficas aproximadas 23°24’22,3 S e 54°46’17,2 WGr., localizado em uma estrada vicinal; daí, segue por linha reta até o ponto P-11, de coordenadas geográficas aproximadas 23°23’45,1 S e 54°46’52,8 WGr., localizado em uma cerca de divisa; daí, segue por linha reta até o ponto P-12, de coordenadas geográficas aproximadas 23°23’14,7 S e 54°47’29,5 WGr., localizado em uma estrada vicinal; daí, segue por linha reta até o ponto P-13, de coordenadas geográficas aproximadas 23°22’39,6 S e 54°48’31,0 WGr., localizado na confluência de um córrego sem denominação com o Córrego Régis Cuê; daí, segue pelo referido córrego , a montante, até a sua cabeceira, ponto P-14, de coordenadas geográficas aproximadas 23°21’12,8 S e 54°48’05,1 WGr.; daí, segue por um caminho entre a mata, sentido geral norte, até o ponto P-15, de coordenadas geográficas aproximadas 23°20’47,0 S e 54°47’58,2 WGr., localizado em uma estrada vicinal; daí, segue por um caminho margeando uma mata, sentido geral norte, até o ponto P-16, de coordenadas geográficas aproximadas 23°20’27,9 S e 54°47’54,6 WGr., localizado em uma cerca; daí, segue em linha reta até o ponto P-17, de coordenadas geográficas aproximadas 23°20’20,5 S e 54°48’11,7 WGr., localizado em uma estrada vicinal; daí, segue por linha reta até o ponto P-18, de coordenadas geográficas aproximadas 23°19’57,2 S e 54°47’58,5 WGr., localizado em um cruzamento de estradas; daí, segue por linha reta até o ponto P-19, de coordenadas geográficas aproximadas 23°19’26,4 S e 54°48’40,7 WGr., localizado em uma estrada vicinal; daí, segue por linha reta até o ponto P-20, de coordenadas geográficas aproximadas 23°19’04,9 S e 54°48’31,0 WGr., localizado na margem do córrego Marcelina; daí, segue pelo referido córrego, a montante, até o ponto P-21, de coordenadas geográficas aproximadas 23°19’05,2 S e 54°48’29,0 WGr., localizado na margem do córrego Marcelina; daí, segue por linha reta até o ponto P-22, de coordenadas geográficas aproximadas 23°18’15,7 S e 54°48’11,5 WGr., localizado em uma estrada vicinal; daí, segue pela referida estrada, sentido geral sudeste, até o ponto P-23, de coordenadas geográficas aproximadas 23°18’23,7 S e 54°47’58,6 WGr., localizado no cruzamento com uma estrada vicinal secundária; daí, segue pela vicinal secundária, sentido geral sudeste, até o ponto P-24, de coordenadas geográficas aproximadas 23°18’28,6 S e 54°47’42,9 WGr., localizado na estrada vicinal; daí, segue por linha reta até o ponto P-25, de coordenadas geográficas aproximadas 23°18’27,2 S e 54°47’42,0 WGr., localizado na cabeceira de um córrego sem denominação; daí, segue pelo referido córrego, a jusante, até o ponto P-01, início da descrição deste perímetro. OBS.: 1- Base cartográfica utilizada na elaboração deste memorial descritivo: MI-2751, MI-2777 Escala 1:100.000 – DSG – 1972/1972. 2- Todas as coordenadas aqui descritas estão georreferenciadas ao Datum WGS84. Responsável Técnico pela Identificação dos Limites: Marcelo Antonio Elihimas Engenheiro Agrônomo CREA nº. 16.154/D – PE.



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