Seguindo os passos do governo brasileiro e seus esforços para limpar o caminho para a construção de novas barragens hidrelétricas na bacia do Amazonas, três correspondentes do LAB viajaram à região e mostram em primeira mão testemunhos dos recentes ataques brutais por parte da polícia em comunidades indígenas do Mato Grosso. Cinco vídeos dramáticos (editado para LAB por Nayana Fernandez) ilustram os eventos.
Por Bruna Rocha, Raoni Valle e Claide Moraes*
Colaboração: Ítala Nepomuceno
Tradução: Bebel Gobbi
A campanha do governo brasileiro contra a mineração ilegal de ouro na região pode ser um pretexto para enviar uma dura advertência aos Munduruku. No dia 07 de novembro, em uma demonstração de força brutal que lembra a ditadura militar, a Polícia Federal e Força Nacional de Segurança desceram com força total em cima da Aldeia Indígena Teles Pires, no norte do estado de Mato Grosso. A operação envolveu um helicóptero e dezenas de homens, armados com metralhadoras e fuzis, vestindo coletes à prova de bala. Até o final do dia, várias pessoas ficaram feridas e um homem - Adenilson Munduruku - foi morto. A polícia negou a morte, mas testemunhas dizem que uma bomba explodiu na cena do crime para encobrir evidências. O corpo de Adenilson flutuou à superfície do rio no dia seguinte.
Todos os habitantes da aldeia, incluindo os idosos, mulheres e crianças, ficaram traumatizados, foram obrigados a deitar no chão sob o sol escaldante, sem água por muitas horas. Eles não foram autorizados a falar uns com os outros em sua própria língua Munduruku. A maioria das imagens filmadas com seus telefones celulares, registrando a violência, foi destruída pela polícia.
As autoridades parecem ter tentado encobrir o assassinato, os primeiros relatos para a imprensa só mencionaram feridos e descreveram uma emboscada contra a polícia. É altamente improvável que esta emboscada realmente tenha acontecido, dado que o helicóptero voando baixo, visto na filmagem, teria tornado praticamente impossível para os índios escaparem.
A draga no rio em frente da aldeia, usada para extrair ouro - que foi, alegadamente, o motivo para a operação policial, já que a mineração não é permitida lá - foi destruída, assim como também destruíram todos os conteúdos a bordo. Como resultado, o rio foi contaminado pela gasolina e outros produtos químicos.
O que levou ao uso de violência indiscriminada por parte das autoridades federais contra uma aldeia indígena?
A operação fez parte da "Operação Eldorado" - uma campanha para combater atividades ilegais de mineração de ouro ao longo do Rio Tapajós e seus afluentes. A bacia do Tapajós é atualmente a região do Brasil com maior mineração de ouro, mais da metade dos 110.000 garimpeiros da região amazônica trabalham lá.
O garimpo ilegal é tão difundido na região, que parece estranho que a aldeia indígena deveria ser o alvo da operação, já que seu funcionamento é relativamente pequeno. Pode haver alguma outra razão?
A Aldeia Teles Pires está na vanguarda da resistência contra a construção de hidrelétricas - sete das quais são planejadas para a bacia do Tapajós. Uma delas está sendo construída nas Sete Quedas, que estão entre os lugares mais sagrados para os Munduruku: para eles, o mundo começou lá. Agora, a área está sendo dinamitada para a barragem Sete Quedas.
Vinte dias antes do "dia do terror", como os índios se referem a ele, uma dura advertência foi emitida por Marta Montenegro, representante da Fundação Nacional do Índio (FUNAI) , em uma reunião na cidade de Itaituba. Ela deixou claro que, se os Munduruku continuassem se recusando a permitir estudos de impacto ambiental relacionados às barragens, o governo teria que usar a força e enviar guardas armados para acompanhar os pesquisadores. Ela fez referência explícita ao emprego da Força de Segurança Nacional e disse que a FUNAI não seria capaz de proteger os índios em tais circunstâncias.
Mais cedo, um grupo de pesquisadores havia sido expulso por índios Munduruku em uma área à direita do rio a ser inundada pela UHE São Luiz do Tapajós, a maior do complexo, que irá abranger mais de 700 quilômetros quadrados em uma das melhores áreas preservadas da Amazônia.
Os pesquisadores não tinham pedido permissão para realizar seus estudos na área porque ainda não foram oficialmente demarcadas como terras indígenas, devido a atrasos no processo de regularização. No entanto, a área tem sido historicamente ocupada pelos Munduruku. A reunião em Itaituba, no dia 17 de Outubro, foi realizada a fim de obter dos Munduruku um acordo para a realização dos estudos de licenciamento ambiental.
Mas os Munduruku são muito conscientes de que permitir os estudos significa mais um passo para a construção da barragem. Apesar do uso de palavras tais como "diálogo" e " participação", as autoridades não fizeram nada para sugerir que eles vão garantir aos índios a não construção das barragens, considerando a legislação brasileira e os tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário. Então, os índios não têm opção a não ser resistir.
No momento em que a Comissão da Verdade investiga os crimes cometidos durante a ditadura militar, incluindo aqueles contra as populações indígenas que "ficaram no caminho" de grandes projetos de infra-estrutura, algumas pessoas vão se perguntar se a presidente Dilma Rousseff pode estar se preparando para repetir os crimes de seus antecessores militares, a fim de limpar o caminho para a construção de barragens na região amazônica. O lema imortal de Cândido Rondon, o fundador do SPI, há cem anos atrás - "morrer se for necessário, mas matar nunca" (índios) - parece estar se transformando em um eco fraco do passado.
Vídeo 1: O corpo de Adenilson Munduruku
Vídeo 2: Eu tenho o rádio. Muitas pessoas estavam gritando.
Vídeo 3: Eles estavam atirando muito perto
Vídeo 4: No chão, algemado com as mãos sobre as suas cabeças.
Vídeo 5: Eles pegaram nossos telefones e os destruíram.
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