Uma área de 6.456 quilômetros quadrados deverá ficar
debaixo d"água para permitir a geração de energia por 34 novas usinas hidrelétricas em
construção ou planejadas para os próximos dez anos. O alagamento necessário
para desengavetar todos esses projetos equivale ao território somado de dez
capitais brasileiras - São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Goiânia,
Porto Alegre, Curitiba, Florianópolis, Fortaleza, Recife e Maceió.
Os dados fazem parte do Plano Decenal de Energia,
divulgado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), para o
período 2012-2021. Das 34 usinas listadas pelo órgão, 19 ainda não foram
sequer licitadas. A maioria está na Amazônia. Outras 15 já tiveram sua
construção iniciada, como a de Belo Monte, em andamento no rio Xingu (PA).
O alagamento previsto com a instalação das novas hidrelétricas corresponde
a 0,078% de todo o território nacional, segundo a EPE, que menciona outros
impactos. Pelo lado negativo, 62 mil pessoas serão diretamente afetadas e
haverá uma perda de 3.450 km2 - mais de duas vezes a área do município de São
Paulo - de vegetação nativa. Pelo lado positivo, 139 mil empregos diretos
serão gerados no pico das obras e haverá compensação financeira estimada em
mais de R$ 4 bilhões, dividida entre Estados e municípios.
O ponto em comum entre quase todas as usinas novas são os
reservatórios a fio d"água, com dimensões menores, a fim de reduzir a
área de inundação. Essa alternativa de engenharia, que serviu de argumento
para minimizar os impactos socioambientais e viabilizar as primeiras hidrelétricas de
grande porte na Amazônia, agora é alvo de questionamentos por autoridades do
setor.
A potência instalada das hidrelétricas aumentará
40% - dos atuais 84 mil para 117 mil megawatts (MW) - entre 2012 e 2021, mas
a capacidade de armazenamento dos reservatórios subirá apenas 5% neste
período. O governo tem dito que a melhor opção, do ponto de vista de
aproveitamento hídrico, seria retomar a construção de usinas com
reservatórios maiores.
Sem entrar em polêmica, na minuta do plano decenal
submetido à audiência pública, a EPE cita que as usinas a fio d"água têm
"grandes alterações de nível dos reservatórios ao longo de curtos ciclos
hidrológicos" e requerem "maior despacho térmico para atender às
exigências sazonais da carga".
Para o diretor da Amigos da Terra - Amazônia Brasileira,
Roberto Smeraldi, a maior falha do planejamento no setor elétrico é insistir
em não atacar as altas perdas técnicas - estimadas em cerca de 20% - das
linhas de transmissão, antes de expandir o parque gerador. Ele se diz
preocupado com o fato de que o impacto indireto das últimas hidrelétricas de
grande porte, como o desmatamento e a ocupação urbana desordenada, tem sido
de oito a dez vezes o tamanho dos reservatórios. "Cada caso é um caso,
obviamente depende do nível de antropização (ocupação humana) que já existe e
da infraestrutura disponível, mas precisamos entender que o impacto vai muito
além da área alagada", afirma.
Smeraldi diz que, caso o governo atacasse o problema das
perdas técnicas no sistema de transmissão, ganharia tempo suficiente para
preparar a chegada de novashidrelétricas, com um trabalho de regularização
fundiária e planejamento para evitar o caos social.
Alessandra Cardoso, assessora política do Instituto de
Estudos Socioeconômicos (Inesc), chama a atenção para novos empreendimentos
que, até o ano passado, não estavam na lista de prioridades do governo. É o
caso de duas megausinas previstas para o rio Juruena, no Mato Grosso. Juntas,
as hidrelétricas de São Simão e Salto Augusto têm potência de 4.970
MW. "Pequenas usinas foram retiradas do planejamento, mas outros
projetos bem maiores foram desenhados para a Amazônia", disse.
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"Por que eu só preciso de pés livres, de mãos dadas e de olhos bem abertos" Guimarães Rosa
quinta-feira, 4 de outubro de 2012
Novas hidrelétricas vão alagar área equivalente a dez capitais
Por
Daniel Rittner e André Borges | De Brasília
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